quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Telediscurso: Dilma tropeça nas frases e Aécio escorrega nos plurais em debate que incluiu até questão não feita, mas presente

Dilma Rousseff (PT) tem dificuldade em expressar-se por meio de frases diretas e claras. Aécio Neves (PSDB) escorrega repetidas vezes no uso do plural de forma correta. Ambos têm curso superior e vieram de famílias mais abastadas do que a média do brasileiro. Marina Silva (PSB), alfabetizada somente aos 16 anos e de origem mais pobre, mostrou-se rigorosa na construção das frases e dos plurais, apesar de primar pela preferência articulações “sonháticas” em vez de pragmáticas.

 A construção do discurso é um dos itens fundamentais da política. No debate da Band, o senador eleito por São Paulo, José Serra, caçoava de Dilma, dizendo sentir-se aliviado cada vez que ela conseguia concluir uma frase. Serra e FHC são donos de discursos racionalistas, construídos com base na experiência catedrática. Como professores, exercitaram a oratória que empregam na política. Mas a maior crítica que pode ser feitas a ambos é que são professorais demais, distantes e autoritários em relação ao ouvinte, porque o saber estabelece hierarquias.

Lula afina o discurso com a voz popular. Não se importa se suas construções gramaticais não atendem aos princípios da chamada língua culta. Abusa da expressão “de que” mesmo quando a regência do verbo ou do nome anterior não permite, de acordo com os padrões. O que sintoniza Lula com o eleitor médio é que ambos constroem sua fala a partir da base comum que tiveram na infância e adolescência. O melhor de Lula são as imagens simples que constrói: a crise econômica internacional é uma “marolinha”, chama os tucanos de “partido de bicudos”. Lula quer sempre mostrar que fala de igual para igual, o que quase nunca é verdade. Pode ter sido igual no passado, mas já não é mais.

Houve três momentos fortes para análise de discurso no debate entre os presidenciáveis na noite desta terça na Band.

Dilma demonstrou sua dificuldade de construção de frase e ordenação do raciocínio em pergunta sobre segurança: “Candidato, vou fazer uma pergunta sobre segurança. O Ministério Público, o conselho do Ministério Público, em 2009, disse que Minas tinha o terceiro pior índice de solução de inquéritos, 2,9% só dos inquéritos eram resolvidos, e isso é algo muito perigoso, porque é o princípio da impunidade. Outra constatação é que nos dez anos do governo do senhor e do próximo governador, as taxas de homicídio cresceram 52%. 56% eram jovens de 15 a 29 anos. Candidato, o senhor sabe que a constituição estipula que é para os municípios, aliás, para os Estados a responsabilidade constitucional da segurança. O que senhor acha disso?”

Em meio a barafunda discursiva, Aécio tripudiou: “Senhora candidata, apesar de muita confusa a sua pergunta, eu vou tentar respondê-la aqui…”.

Outro momento discursivo forte ocorreu quando Dilma perguntou a Aécio sobre a construção do aeroporto em Cláudio (MG) na terra de um tio do tucano. “Eu quero responder a candidata Dilma olhando nos seus olhos. A senhora está sendo leviana, candidata, leviana. O Ministério Público Federal atestou a regularidade dessa obra, eu tenho que agradecer a oportunidade de falar sobre isso. Eu fiz milhares de obras no meu governo, milhares, todas elas atestadas como obras corretas para beneficiar as pessoas”, rebateu o tucano. Por dois momentos quando responde, Aécio desvia olhos de Dilma e os põe em direção à câmara (no telespectador). Esses desvios comprometeram a intenção do tucano, apesar da forma segura de suas palavras. Queria demonstrar autoridade em relação à adversária,  mas as duas fugas do olhar demonstraram certa insegurança.

Essa fragilidade se acentuaria numa armadilha psicológica lançada por Dilma. Entabulou uma questão que não foi feita, mas ficou como sombra durante toda a resposta do adversário. Uma espécie de questão invisível. Dilma não quis assumir os riscos de fazê-la de forma direta. Preferiu ser oblíqua.

Sem citar a acusação de que Aécio deu um empurrão e um tapa em uma mulher que o acompanhava em evento no hotel Fasano no Rio, noticiada pelo jornalista Juca Kfouri em 1/11/2009 e negada pelo tucano, a petista disse: “Queria lhe perguntar agora como o senhor vê a questão da violência contra a mulher. Para mim, é um compromisso fundamental. Acredito que a violência que afeta a mulher atinge os lares, destrói os laços familiares, inclusive prejudica jovens e crianças. Ela deve ser combatida em todas as suas dimensões. A lei Maria da Penha foi um grande avanço nesse sentido, aprovada no governo do Presidente Lula e reaprovada no meu governo, porque ganhamos no Supremo. Se o senhor, se o senhor olhar a questão da violência contra a mulher, o senhor seria capaz de extinguir a secretaria que protege os direitos da mulher dentro do governo federal? O senhor faria o que para garantir que essa luta contra a violência continue?”

Aécio respondeu: “Candidata, ninguém pode se apropriar de uma lei tão importante como essa, fruto de uma profunda discussão no Congresso Nacional, que envolveu gerações de parlamentares. Eu me lembro quando essa discussão se iniciou, muito antes até do governo do Presidente Lula, foi um avanço extremamente importante, que tem que ser mantido e aprimorado. Mas nós vemos que avançar no apoio, candidata aos estados e aos municípios que não têm tido a estrutura e a condição necessária ao enfrentamento da violência contra a mulher, seja nos programas disque denúncia, seja nas delegacias próprias que nós temos que avançar. 

Em Minas até avançamos razoavelmente. O que eu tenho dito, candidata, independente dessa ou de outra área, é que as políticos públicas para terem resultados, elas não precisam ter a conduzi-la um carro preto com chapa verde e amarela e tampouco um conjunto de ideais. Tenho absoluta convicção de que nós temos como avançar muito no que diz respeito a proteção a mulher, a oportunidade para as mulheres terem um salário mais justo, mais próximo do que têm os homens, nós estamos extremamente longe disso.”
Para sair de momento em que parecia desconfortável, Aécio gastou a metade restante da resposta falando sobre segurança pública em geral, não sobre a situação da mulher em particular. E deu a entender que extinguiria a secretaria dos direitos da mulher. 


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